Lindôra Araújo argumentou que ‘exagero na utilização do vocábulo não se sobrepõe à imunidade parlamentar’. Nikolas desrespeitou deputadas trans ao vestir uma peruca e dizer que ‘se sentia uma mulher’ em discurso no Dia Internacional da Mulher. O deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) em discurso no plenário da Câmara dos Deputados, em Brasília.
Pablo Valadares/Câmara dos Deputados
A Procuradoria-Geral da República (PGR) defendeu que o Supremo Tribunal Federal (STF) rejeite pedidos de investigação do deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) após um discurso transfóbico do parlamentar no plenário da Câmara.
Para a PGR, mesmo que a manifestação “possa ser considerada de mau gosto e/ou com excessos”, o caso se enquadra na chamada imunidade parlamentar (entenda mais abaixo).
No Dia Internacional da Mulher, durante sessão destinada a discursos dos parlamentares, o deputado disse que as mulheres estão perdendo espaço para homens que se sentem mulheres.
Pouco antes dele, subiu à tribuna a deputada Erika Hilton (PSOL-SP). Ela e Duda Salabert (PDT-MG) são as primeiras deputadas federais transexuais da história.
O deputado desrespeitou as deputadas ao vestir uma peruca e dizer que hoje, no Dia Internacional da Mulher, se sentia uma mulher.
“Hoje, no Dia Internacional das Mulheres, a esquerda disse que eu não poderia falar, porque eu não estava no meu local de fala. Solucionei esse problema [vestiu uma peruca]. Hoje, me sinto mulher. [Sou a] Deputada, Nicole. As mulheres estão perdendo seu espaço para homens que se sentem mulheres” afirmou.
À época, o discurso chegou a ser criticado pelo presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL), nas redes sociais. Lira afirmou que o plenário da Casa não é palco para “discursos preconceituosos” e que não admitiria “desrespeito contra ninguém”.
“O deputado Nikolas Ferreira merece minha reprimenda pública por sua atitude no dia de hoje”, acrescentou.
Imunidade parlamentar
Entidades e parlamentares, então, questionaram a declaração de Nikolas e sustentaram no STF que a fala configura discurso de ódio.
Na avaliação da vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, a declaração do deputado, no entanto, está protegida pela chamada imunidade parlamentar.
A Constituição fixa que deputados e senadores têm a chamada imunidade parlamentar e não podem ser responsabilizados em ações cíveis e penais por opiniões, palavras e votos, desde que os atos estejam relacionados à atuação no Congresso.
“Diante dos elementos coligidos, constata-se que o caso em análise se encontra abrangido pela imunidade material absoluta dos parlamentares federais, afastando, portanto, a hipótese de prática de ilícito penal ou civil pelo representado”, escreveu a PGR.
Segundo Lindôra, nesse caso, a “incidência da imunidade absoluta não depende do teor do discurso feito”.
“Constata-se, pois, que a manifestação do representado, mesmo que possa ser considerada de mau gosto e/ou com excessos, também está protegida pela imunidade material absoluta, pois proferida na tribuna da Câmara dos Deputados”, afirmou.
Lindôra Araújo disse ainda que o Supremo já entendeu que o “exagero na utilização do vocábulo não se sobrepõe à imunidade parlamentar no que tem com o objetivo maior o exercício do mandato sem intimidações de qualquer ordem”.
Danos morais
Em outro caso envolvendo Duda Salabert, Nikolas Ferreira foi condenado, em abril, a pagar R$ 80 mil em indenização por danos morais por se negar a respeitar a identidade de gênero da parlamentar.
O juiz José Ricardo dos Santos de Freitas Véras, da 33ª Vara Cível de Belo Horizonte, analisou declarações da época em Duda e Nikolas atuavam como vereadores da capital mineira.
“Restou comprovado que o requerido […] se negou a reconhecer a autora como mulher. Realizou, ainda, comentários jocosos e irônicos em suas redes sociais a respeito da identidade de gênero da requerente, os quais tiveram grande repercussão, com mais de 8 mil ‘likes’ no Twitter e 57 mil no Instagram”, escreveu na decisão, que ainda cabe recurso.
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