Presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, abriu a sessão explicando os pontos que seriam analisados, quando o ministro André Mendonça começou a falar. Em seguida, ele pediu a palavra. Mendonça interrompe Barroso em sessão do STF sobre drogas
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) André Mendonça interrompeu a abertura da sessão desta quinta-feira (20) que debate os critérios que configuram porte de maconha para uso pessoal.
Na ocasião, o placar estava em 5 a 3 pela descriminalização do porte para consumo.
“Nós estamos passando por cima do legislador caso a votação prevaleça com essa votação que está estabelecida. O legislador definiu que portar drogas é crime. Transformar isso em ilícito administrativo é ultrapassar a vontade do legislador”, disse Mendonça.
O presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, abriu a sessão explicando os pontos que seriam analisados.
Barroso contou que presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) fez uma ligação para ele querendo entender o que seria julgado e chegou a afirmar que teria recebido informação equivocada.
Segundo Barroso, o “porte de drogas é um ato ilícito” e a discussão não se referiria a isso, uma vez que esse entendimento permaneceria o mesmo.
Luis Roberto Barroso, durante julgamento do porte de maconha, no STF
Reprodução/TV Justiça
Ele esclareceu que são dois pontos em análise na sessão desta quinta:
Se o porte da droga vai ser considerado um ilícito administrativo ou penal;
Se será possível fixar uma quantidade de droga para diferenciar usuário de traficante. E qual quantidade será essa.
No momento em que o presidente do STF esclarecia o que estava em discussão, o ministro André Mendonça, que participava da sessão por videoconferência, começou a falar.
Em seguida, Mendonça pediu a palavra. Em um dado momento, ele disse que o Supremo estaria passando por cima do legislador, já que o legislador definiu que portar drogas é crime.
“Nenhum país do mundo fez isso por decisão judicial. Nenhum. Em segundo lugar, a grande pergunta que fica é: [digamos que é] um ilícito administrativo. Quem vai fiscalizar? Quem vai processar? Quem vai condenar? Quem vai acompanhar a execução dessa sanção?”, questionou o ministro.
“Essa decisão tem que ser adotada pelo legislador. Eu sou contra. Sou contra, mas eu me curvaria caso o legislador deliberasse em sentido contrário. Apenas estou seguindo a minha opinião e entendo que o presidente [da CNBB] não é vítima de desinformação”, completou Mendonça.
Em resposta, o ministro Barroso disse: “Vossa excelência acaba de dizer a mesma coisa que eu disse apenas com um tom mais panfletário”.
Retomada do julgamento
O STF retomou nesta quinta um recurso que discute critérios que configuram porte de maconha para uso pessoal.
O julgamento começou em 2015. Uma decisão da Corte terá impacto em pelo menos 6.354 processos, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça.
O processo tem repercussão geral, ou seja, a decisão tomada pelo tribunal deverá ser aplicada pelas outras instâncias da Justiça em processos com o mesmo tema. Isso vai ocorrer a partir de uma espécie de guia que será elaborado pelos ministros logo após a conclusão da deliberação.
Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça, há pelo menos 6.354 processos com casos semelhantes suspensos em instâncias inferiores da Justiça, aguardando uma decisão do tribunal.
O que está em jogo
O tribunal deve decidir se é crime uma pessoa ter consigo drogas para seu próprio consumo. Além disso, deve fixar, em relação a uma ou mais substâncias, a quantidade considerada como de uso individual.
A discussão não envolve o tráfico de drogas, conduta punida como crime que vai continuar sendo um delito, com pena de 5 a 20 anos de prisão.
Validade da Lei de Drogas
A Lei de Drogas, de 2006, estabelece, em seu artigo 28, que é crime adquirir, guardar e transportar entorpecentes para consumo pessoal.
No entanto, a legislação não fixa uma pena de prisão para a conduta, mas sim sanções como advertência, prestação de serviços à comunidade e aplicação de medidas educativas (estas duas últimas, pelo prazo máximo de 5 meses).
Ou seja, embora seja um delito, a prática não leva o acusado para prisão. Os processos correm em juizados especiais criminais e a condenação não fica registrada nos antecedentes criminais.
A norma não diz quais são as substâncias classificadas como droga – essa informação é detalhada em um regulamento do Ministério da Saúde.
Além disso, determina que cabe ao juiz avaliar, no caso concreto, se o entorpecente é para uso individual.
Para isso, o magistrado terá de levar em conta os seguintes requisitos: a natureza e a quantidade da substância apreendida, o local e as circunstâncias da apreensão, as circunstâncias sociais e pessoais da pessoa que portava o produto, além de suas condutas e antecedentes.
Ou seja, não há um critério específico de quantidades estabelecido em lei. Com isso, a avaliação fica a cargo da Justiça.
A lei de 2006 substituiu a regra que vigorava desde 1976. Na antiga Lei de Drogas, carregar o produto para uso individual era crime punido com prisão – detenção de 6 meses a dois anos, além de multa.
Diferenças entre descriminalização, despenalização e legalização
Despenalizar significa substituir uma pena de prisão (que restringe a liberdade) por punições de outra natureza (restrições de direitos, por exemplo).
Legalizar é estabelecer uma série de leis que permitem e regulamentam uma conduta. Estas normas organizam a atividade e estabelecem suas condições e restrições – regras de produção, venda, por exemplo. Também pune quem descumpre o que for definido. Na prática, é autorizar por meio de uma regra.
Já descriminalizar consiste em deixar de considerar uma ação como crime. Ou seja, em âmbito penal, a punição deixa de existir. Mas é possível ainda aplicar sanções administrativas ou civis.
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