Rodinei Crescêncio
Se tomarmos o termo “ideal” como uma meta, em um modo de produção econômica poderíamos dizer que a meta é um modelo que produza com sustentabilidade ambiental, que tenha bastante recursos naturais mas agregue valor com serviços e industrialização e promova uma distribuição da renda, diminuindo as desigualdades em sua sociedade.
Mato Grosso ainda convive com profundas desigualdades regionais e sociais, isso é certo, mas neste artigo quero falar de regiões dentro de Mato Grosso que estão muito próximos da meta, ou de um modelo ideal de economia e sociedade.
O crescimento do agronegócio, especialmente a partir do final do século passado, fez com que Mato Grosso ganhasse destaque no cenário mundial, principalmente com a soja, algodão e gado bovino. Mas os indicadores positivos da produção e das exportações sempre conviveram com críticas, sobretudo ambientais e pelo fato das exportações serem muito concentradas no modo primário, por exemplo a soja in natura. Sendo assim, o Estado estava bem longe de ser um modelo ideal.
Porém, nos últimos anos pode se dizer que algumas das críticas ambientais, como o desmatamento ilegal, saíram da pauta dos produtores do agronegócio, já que é justo dizer que a grande maioria dos produtores adotaram práticas que hoje chamamos de “baixo carbono”, o que inclui o respeito pelo desmatamento dentro dos limites legais, embora ainda seja preciso cuidados como a utilização desenfreada da água do subsolo e dos rios, o que pode colocar em risco uma das principais riquezas de Mato Grosso.
Com relação a diminuição das desigualdades, a prévia do Censo demográfico de 2023 aponta que Mato Grosso foi o Estado que mais diminuiu as desigualdades sociais no país, embora ainda mantenha as desigualdades regionais.
E é nesse ponto que entra minha principal constatação: algumas regiões de Mato Grosso têm um modo de produção que, além das conquistas ambientais e por serem as responsáveis por diminuir a média do Estado em termos de desigualdades sociais, ainda agregam muito valor a produção. Demonstro…
“Se o mundo passar a pagar pelo ativo ambiental que Mato Grosso mantém, o Estado passará a ter um novo patamar de importância na geopolítica mundial”
Maurício Munhoz
Até o ano de 1996, o PIB agropecuário era a principal matriz em Sorriso e em Primavera do Leste. Hoje, mesmo que a produção primária (agrícola e pecuária) continuem aumentado em ambos municípios, assim como em todo Mato Grosso (O Estado possui o maior valor bruto de produção agropecuária do pais), a principal matriz do PIB de Sorriso é o setor de serviços e o de Primavera do Leste é a indústria.
Estamos convivendo com economias complexas em Mato Grosso, citei o exemplo desses dois municípios e existem outros assim. Neles temos mais empregos complexos, como os mecânicos das modernas máquinas agrícolas e os engenheiros das indústrias de etanol. Esses trabalhadores mais remunerados ajudam a criar uma rede de comércio e serviços mais diversificada, que por sua vez emprega mais gente, girando o ciclo da economia local.
Há outros fatores que demonstram o célere ritmo de crescimento da economia de Mato Grosso, como o consumo de energia elétrica industrial. Nesse item, Mato Grosso é o Estado que mais cresce em todo país. Outras matrizes estão ganhando corpo, em diversos dos seus municípios, como a mineração, mas há um segmento que pode promover um salto ainda maior nos indicadores econômicos, sociais e ambientais, que é a devida exploração do capital ambiental do Estado.
Se o mundo passar a pagar pelo ativo ambiental que Mato Grosso mantém, o Estado passará a ter um novo patamar de importância na geopolítica mundial. E isso é uma questão de tempo.
Usei a ideia de “tipo ideal” do sociólogo Max Weber, e aproveito para destacar uma visão do amigo e professor da Unemat Raimundo França: Os produtores rurais que migraram para as regiões de grande produção agrícola, como Sorriso e Primavera do Leste, tem um modo de interpretar o mundo semelhante ao que o mesmo Weber descreveu no seu livro “Ética protestante e o espírito do capitalismo”, ou seja, é a ética protestante do trabalho, onde prosperar financeiramente não é visto como um pecado, o que é usado para explicar o desenvolvimento econômico dos Estados Unidos e o atraso de outros países onde as sociedades tiveram a influência do catolicismo e a condenação da riqueza.
Maurício Munhoz Ferraz é sociólogo, atual superintendente federal de Agricultura e Pecuária no Estado de Mato Grosso, ocupou o cargo de secretário de Estado de Ciência, Tecnologia e Inovação de Mato Grosso em 2022. Atuou recentemente também como consultor, diretor de pesquisas da Fecomércio-MT e professor de economia da Unemat. Tem mestrado em sociologia, é vice-presidente da Câmara de Comércio Brasil-Rússia, membro do projeto governança metropolitana do Instituto de Pesquisa Economia Aplicada do Governo Federal (IPEA), vencedor do Prêmio Celso Furtado de economia e escreve nesta coluna com exclusividade aos sábados. E-mail: mauriciomunhozferraz@yahoo.com.br