Desmatamento insere Colniza no eixo da violência e escassez na Amazônia | …

Marcelo Camargo/Agência Brasil Geral

Desmatamento Colniza

Queimadas, calor extremo, morte de animais e degradação vegetal são associações rápidas quando se avalia o desmatamento em Mato Grosso. No entanto, somado a todos esses elementos, áreas onde há derrubada de floresta, em grande parte de forma ilegal, refletem o contexto de violência e escassez de qualidade de vida para a população. O resultado desse cenário pode ser visto no município de Colniza, que no último triênio se tornou o maior do Estado em relação à expansão de área devastada, com um total de 904,6 km².

Segundo o relatório Cartografias da Violência na Amazônia, publicado recentemente pelo Fórum de Segurança Pública, o desmatamento desenfreado em Colniza resulta ainda em mais de 12 mil hectares de exploração de madeira ilegal – ocupação essa que atrai conflitos na região, que carece de policiamento ambiental efetivo e acaba por ser coroada com uma alta taxa de homicídios.

De acordo com o levantamento, Colniza é o quinto município de Mato Grosso, entre os pertencentes à Amazônia Legal, com maior nível de violência, com uma taxa de 82,7 mortes violentas a cada 100 mil pessoas.

É confronto na zona de crime do contrabando, em relação a disputas de terras patrimoniais, com populações indígenas e tradicionais e, de maneira geral, daqueles que vivem em circunstâncias de marginalidades frente a essa lógica de ocupação


Rafael Vieira Nunes, pesquisador

“Os confrontos são de certa forma naturais nessa lógica de ocupação. É confronto na zona de crime do contrabando, em relação a disputas de terras patrimoniais, com populações indígenas e tradicionais e, de maneira geral, daqueles que vivem em circunstâncias de marginalidades frente a essa lógica de ocupação”, destaca o pesquisador o pesquisador e doutor em Ecologia e Conservação da Biodiversidade, Rafael Vieira Nunes.

Em entrevista ao , Nunes destaca que o desmatamento é um típico modo de ocupação em Mato Grosso que resulta em degradação, sendo prejudicial tanto social quanto ambientalmente. Pontua ainda que o município de Colniza, hoje, se insere em um arco de desmatamento que, há 10 anos, se concentrava em Sinop.

O pesquisador explica que o processo de desmatamento se inicia com a derrubada das árvores para exploração da madeira e termina com a prática de pecuária ou de monocultura no território – nesse último caso, transformando o que primeiro era uma densa floresta em “imensas zonas de plantio de grãos, como soja e milho”.

No entanto, o que poderia ser traduzido como um “boom” econômico na região como ocorre em outros municípios do Estado, em Colniza não se repete – principalmente por causa das atividades ilegais ambientais que lá ocorrem. Com um Produto Interno Bruto (PIB) de R$ 20,6 mil per capita, o município está muito aquém da média de outras cidades que vivem do agro e da própria média geral de Mato Grosso – de R$ 65,4 mil per capita -, o que coloca o estado como o segundo com maior PIB no país.

“Por causa do contrabando, nenhuma dessas madeiras, que são nobres, ficam nessas cidades. Em Colniza, por exemplo, você não vai encontrar móveis, mesas e produtos de madeiras nobres da região sendo vendida lá. É tudo comercializado fora da cidade, de forma ilegal, e evidentemente não traz nenhum tipo de benefício econômico para o local. É uma disputa de território que prejudica as populações tradicionais e afeta diretamente a organização urbana, que se expande com condições sociais precárias”, analisa o especialista.

A região onde Colniza está inserida é outro ponto que dificulta a mudança da realidade local. No extremo norte do Estado, encontra-se mais perto do Pará do que da capital mato-grossense, Cuiabá. Com mais de 1.000 km entre uma cidade e outra, são encontradas estradas ainda sem asfalto e pontes em situações precárias. Uma lógica que, segundo o pesquisador em política ambiental, favorece o transporte ilegal de madeira e dificulta a entrada de fiscalização. 

“Na verdade, são áreas de difícil acesso e atuação. É muito complexa a prática da fiscalização, até mesmo pensando na segurança do profissional. Existem barreiras que operam no sentido de inviabilizar a chegada de pesquisadores, fiscais e agentes que podem denunciar uma realidade totalmente nociva à sustentabilidade e preservação ambiental nessas regiões, por exemplo”, explica o pesquisador.

O que nos chama atenção é a ausência de delegacias de conflitos agrários em estados que estavam entre os que mais registraram conflitos agrários no último ano: Maranhão, Mato Grosso e Amazonas.


Trecho do relatório “Cartografias da Violência na Amazônia”

Tais barreiras de acesso de uma possível repressão de práticas criminosas acabam também impedindo a maior circulação de produtos presentes no cotidiano da população. Frutas, verduras e serviços médicos são mais caros na cidade justamente por causa de fretes e custo para o conversação do produto.

Crimes e policiamento

Agravante à ocorrência de crimes e confrontos, o relatório Cartografias da Violência na Amazônia ressalta que há pouco policiamento na região de Colniza e em grande parte da Amazônia Legal em Mato Grosso.

“O que nos chama atenção é a ausência de delegacias de conflitos agrários em estados que estavam entre os que mais registraram conflitos agrários no último ano: Maranhão, Mato Grosso e Amazonas. De acordo com o relatório da Comissão Pastoral da Terra, os três estados registraram, respectivamente, 177, 147 e 152 conflitos por terra em 2022”, pontua trecho do estudo.

Na região da Amazônia Legal, Mato Grosso possui somente uma Delegacia Especializada em Meio Ambiente, uma em Crime Organizado, uma em Corrupção e uma em Drogas e Entorpecentes – o que na visão do especialista Rafael Nunes, não significa necessariamente um maior controle de práticas ilegais.

Segundo Nunes, existe uma política de ocupação patrimonial da terra muito maior e mais complexa. “Não basta somente colocar um policiamento baseado em uma política sem compromisso socioambiental. É preciso uma mudança na estrutura, até mesmo para garantir segurança para povos indígenas e comunidades tradicionais. De outra maneira, me parece que seria somente um aumento de confrontos, que por si só já existem”, crava.

Tal ponto é igualmente destacado no relatório feito pelo Fórum de Segurança Pública, que cita que a média do efetivo pela população aponta a existência de policial civil para cada 1.877 habitantes, considerando todos os estados que compõem a Amazônia Legal.

“Aqui, o raciocínio que precisa ser feito é: quanto mais habitantes por policial, menos guarnecida estaria a população. Nesse sentido, os cenários mais preocupantes são no Pará, onde existem 3.449 habitantes por policial, e em Mato Grosso, onde a razão é de 2.887”, completa o levantamento.

Metrópoles

Desmatamento Amaz�nia

Mato Grosso ocupa o terceiro lugar no ranking de maiores áreas desmatadas na região da Amazônia Legal

Mato Grosso é o 3° estado que mais desmata

Ainda segundo o Fórum de Segurança Pública, Mato Grosso ocupa o terceiro lugar no ranking de maiores áreas desmatadas na Amazônia Legal. De acordo com o relatório, que monitora a região, de 2004 a 2023, Mato Grosso já acumula uma área desmatada de 152.078 km² somente no bioma Amazônico. Ao fazer o recorte apenas dos últimos três anos, a área desmatada soma 5.919 km². 

O estudo mostra ainda que, em 2022, foram registrados 581 incêndios criminosos na Amazônia, e o maior número das ocorrências foi em Mato Grosso, com 240 casos. Ao considerar a exploração de madeira, autorizada ou não, na Amazônia Legal, o estado do Mato Grosso corresponde a 65,8% da exploração na região.

Panorama da Sema

A Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema) divulgou que aplicou R$ 1,8 bilhão em multas e embargou 287 mil hectares por crimes ambientais em 2023, em todo o Mato Grosso. O valor das multas é 50% superior ao registrado em 2022, sendo a maioria por desmatamento ilegal. O tamanho da área embargada também é 52% maior que no ano passado. Em 2022, as multas por crimes ambientais somaram R$ 1,2 bilhão e a área embargada totalizou 188 mil hectares.

O Governo de Mato Grosso destinou 13 novos veículos com guincho para o início da Operação Amazônia, em março deste ano. Neste ano, a Sema atendeu 3.292 alertas de desmatamento em ações deflagradas no âmbito da Operação Amazônia, que contou com aproximadamente 200 servidores em campo.



Fonte

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *