Aos 64 anos, peregrino brasileiro se prepara para fazer pela 13ª vez o Caminho de Santiago de Compostela | Blog Longevidade: modo de usar

Em 2018, conheci Elizabeth, 78 anos, da Nova Zelândia. Andava devagar e ainda carregava duas mochilas. Havia ficado viúva e pôs os pés na estrada. No fim de tarde, deu de cara com o albergue lotado e teria de caminhar mais cinco quilômetros para tentar a sorte em outro, porque não há sistema de reservas. Cedi minha acomodação para ela e, num papelão estirado no chão da cozinha, ao lado do fogão a lenha, dormi feito um anjo. Os “pueblos” sempre encontram uma solução quando há gente demais, como abrir igrejas e colégios se for necessário. Em 2017, dormi, com um certo frio na barriga, no banco de uma catedral. Sono dos deuses. Entre os “amigos de infância” havia especialmente italianos, sempre bons na cozinha do albergue e generosos no partilhar o vinho: o macarrão é o alimento-mor do peregrino. Lembro-me de um grupo de três sicilianos que carregou no colo, nos ombros, do jeito que arrumaram, o quarto integrante, que torcera o pé, por dezenas de quilômetros. São muitas histórias de vida: o monge irlandês John fazia o Caminho Francês com vestes franciscanas e um violão nas costas, tentando renovar a fé em Deus depois de perder os pais. A cada quilômetro, ajoelhava-se e rezava. Albert, de 67 anos, saíra Bruxelas a pé horas depois de sepultar a esposa, que morrera de câncer. “Saí do cemitério, peguei a mochila e vim. Para que ficar em casa sem a pessoa com quem convivi meio século?”, disse-me, pouco depois de completar cinco meses de sua estrada de três mil quilômetros. Mathie, 21 anos na época, contou-me na ponte romana na entrada de Pamplona que fazia o Caminho com os pais e uma irmã, todos buscando forças para suportar a morte de seu irmão, ocorrida num acidente de carro em Quebec, no Canadá. O médico Paulo, no Caminho Português Central, em Ponte de Lima, a cidade do vinho verde, me revelou que recebera o diagnóstico de câncer e decidiu andar 400 quilômetros sozinho para pensar como seguiria na vida.

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