Rodinei Crescêncio
Em um contexto marcado por crescentes preocupações com o meio ambiente e a sustentabilidade, o veto do governo de Mato Grosso ao Índice de Crescimento Sustentável dos Municípios (ICSM) levanta questões cruciais sobre o compromisso do Estado com o desenvolvimento responsável. Aprovado na Assembleia Legislativa por unanimidade, o ICSM visava servir como ferramenta para medir o progresso das cidades mato-grossenses, considerando indicadores de saúde, segurança, desenvolvimento econômico e, principalmente, ambientais.
No entanto, o veto do governo, justificado pela existência de um índice similar já existente, o Índice de Condição e Qualidade de Vida de Mato Grosso (ICQV-MT), esconde uma realidade mais complexa. Segundo especialistas, o principal motivo do veto reside na utilização do ICSM de dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que apontam um aumento preocupante no desmatamento e nas queimadas no Estado.
“Ao invés de ignorar os dados do Inpe e seus alertas sobre o desmatamento, o governo deveria utilizar essas informações como base para a formulação de políticas públicas eficazes e para a promoção de um modelo de desenvolvimento que concilie crescimento econômico com a preservação ambiental”
Essa informação, considerada inconveniente pelo governo, evidenciaria a necessidade de ações mais contundentes para combater a devastação ambiental e promover o desenvolvimento sustentável. O ICSM, portanto, funcionaria como um alerta e um guia para a tomada de decisões mais responsáveis, em consonância com o conceito de “bem comum” defendido pela americana Eleanor Ostrom.
Eleanor Ostrom, premiada com o Nobel de Economia em 2009, dedicou sua vida a estudar a gestão de recursos comuns, defendendo a ideia de que a colaboração e a responsabilidade compartilhada são essenciais para a preservação do meio ambiente e o bem-estar das comunidades. Sua teoria do “bem comum” propõe que, diante de recursos limitados como florestas e água, a chave para a sustentabilidade reside na capacidade das comunidades de se auto-organizar e estabelecer regras para o uso responsável desses recursos.
No contexto do veto ao ICSM, a teoria de Ostrom torna-se ainda mais relevante. O desmatamento em Mato Grosso não é apenas um problema ambiental, mas também uma questão social e econômica que afeta a vida de milhões de pessoas. A preservação da Amazônia, bioma vital para o planeta, depende da ação conjunta de governos, empresas e comunidades locais.
O ICSM, que foi criado por mim e fez parte do estudo vencedor do Prêmio Celso Furtado em 2019, ao integrar indicadores ambientais em sua avaliação do progresso municipal, oferecia uma oportunidade única para o Estado de Mato Grosso se comprometer com o desenvolvimento sustentável. Ao invés de ignorar os dados do Inpe e seus alertas sobre o desmatamento, o governo deveria utilizar essas informações como base para a formulação de políticas públicas eficazes e para a promoção de um modelo de desenvolvimento que concilie crescimento econômico com a preservação ambiental.
O veto ao ICSM representa um retrocesso na busca por um futuro mais verde e próspero para Mato Grosso. É fundamental que o governo reconsidere sua posição e reconheça a importância de um índice que incentive a responsabilidade ambiental e a gestão transparente dos recursos naturais. O bem-estar das próximas gerações depende da capacidade do Estado de se comprometer com o desenvolvimento sustentável, e o ICSM poderia ser uma ferramenta crucial nesse processo.
O veto ao ICSM revela um dilema crucial: priorizar o curto prazo e o interesse imediato de alguns setores, ou investir no futuro e na construção de um Mato Grosso mais sustentável e próspero para todos. A escolha é clara: o bem-estar das próximas gerações depende da responsabilidade do presente. É hora de o governo de Mato Grosso abraçar o conceito de “bem comum” e reconhecer a importância da preservação ambiental como base para o desenvolvimento sustentável. O ICSM, ou um índice similar que incorpore indicadores ambientais robustos, pode ser a ferramenta necessária para guiar o Estado nesse caminho.
Escrito com Sara Nadur Ribeiro
Maurício Munhoz Ferraz é sociólogo e professor. Atua atualmente como assessor do conselheiro Sérgio Ricardo na presidência do Tribunal de Contas do Estado (TCE). Foi superintendente federal de Agricultura e Pecuária no Estado de Mato Grosso, ocupou o cargo de secretário de Estado de Ciência, Tecnologia e Inovação de Mato Grosso em 2022. Trabalhou também como consultor, diretor de pesquisas da Fecomércio-MT e professor de economia da Unemat. Tem mestrado em sociologia, é vice-presidente da Câmara de Comércio Brasil-Rússia, membro do projeto governança metropolitana do Instituto de Pesquisa Economia Aplicada do Governo Federal (IPEA), vencedor do Prêmio Celso Furtado de economia e escreve nesta coluna com exclusividade aos sábados. E-mail: mauriciomunhozferraz@yahoo.com.br