O desafio da sucessão no agronegócio | …

Rodinei Crescêncio

Ana Lacerda arte colunista

O agronegócio, elemento vital para a economia do Brasil e, mais especificamente, do estado de Mato Grosso, enfrenta atualmente um desafio crucial: a sucessão nas propriedades rurais. É necessário conceituar que a sucessão, em termos jurídicos, refere-se à transferência de direitos, obrigações, propriedades e outros elementos de uma pessoa para outra, seja por meio de herança, testamento ou outros instrumentos legais. Esse processo ocorre em situações envolvendo morte, incapacidade ou retirada de um indivíduo que detém direitos e responsabilidades sobre determinados bens ou interesses.

No Brasil, a sucessão é regulamentada pelo Código Civil (Lei nº 10.406/2002), especialmente nos artigos 1.784 a 2.027, os quais estabelecem regras sobre herança, legados, testamentos e direitos dos herdeiros e legatários. Em termos, tem-se o objetivo de regular, de maneira justa e ordenada, a transferência de direitos e obrigações entre pessoas, garantindo a proteção dos interesses legítimos dos envolvidos e a preservação do patrimônio ao longo das gerações.

No contexto da sucessão no agronegócio e da preocupação com a continuidade das atividades rurais, questões sucessórias podem ser particularmente relevantes para garantir a transferência legal dos ativos produtivos de uma geração para outra.

O crescente desinteresse dos jovens em dar continuidade aos negócios familiares no campo suscita preocupações sobre o futuro da produção agropecuária e seus impactos econômicos, sociais e ambientais.  Dados estatísticos apontam que, até o ano de 2021, a migração dos jovens do campo para áreas urbanas se acentuou. Segundo o Censo Agropecuário de 2017, o Brasil perdeu cerca de 1,5 milhão de estabelecimentos rurais entre 2006 e 2017, uma tendência preocupante.

E ainda, a questão da transição hereditária no âmbito familiar rural também foi retratada em um estudo intitulado “Governança e administração do patrimônio das famílias do setor agroindustrial”, realizado no ano de 2021 pela Fundação Dom Cabral e pela J Valério Gestão e Progresso, que revelou que mais de 80% das empresas são lideradas pelos seus fundadores (41%) ou pela segunda geração (41%), ou seja, os dados mostram que apenas 16% dos gestores pertencem à terceira geração, e apenas 1% são da quarta geração em diante.

 

Mais de 70% destas famílias não possuem um plano efetivo de sucessão, isso significa dizer que na eventual impossibilidade de quem gere o negócio continuar gerindo, por qualquer motivo, não há quem siga com os negócios.


Ana Lacerda

E para agravar a situação, mais de 70% destas famílias não possuem um plano efetivo de sucessão, isso significa dizer que na eventual impossibilidade de quem gere o negócio continuar gerindo, por qualquer motivo, não há quem siga com os negócios.

As razões por trás dessa migração incluem a busca por melhores oportunidades educacionais e de emprego nas cidades, a percepção de falta de inovação no setor rural e as dificuldades associadas à gestão e sucessão de negócios familiares, bem como a insegurança jurídica e, por consequência, econômica, sofridas pelo setor. O enfrentamento do desafio da sucessão no agronegócio exige a implementação de políticas públicas efetivas. O Estado deve desenvolver estratégias que estimulem a permanência dos jovens no campo, promovendo a capacitação, o acesso ao crédito e à tecnologia, bem como incentivando a adoção de práticas sustentáveis.

É preciso destacar, que a gestão eficaz de uma propriedade rural requer uma abordagem holística que engloba diversas áreas-chave, das operações diárias à tomada de decisões estratégicas. Essa abordagem abrange funções administrativas cruciais, que incluem o conhecimento técnico, a apuração de resultados, a gestão de pessoas e as finanças. Em um cenário no qual a sucessão no agronegócio e o desinteresse dos jovens em permanecerem no campo se apresentam como desafios significativos, a aplicação de ferramentas de gestão e a profissionalização da atividade rural emergem como etapas imprescindíveis para a valorização desse setor vital para a economia brasileira.

Além disso, é fundamental criar mecanismos legais que facilitem a sucessão familiar, como forma simplificada de transferência de propriedade e benefícios fiscais para os jovens produtores rurais. A promoção da educação rural e o fortalecimento da agricultura familiar devem ser objetivos centrais dessas políticas. É preciso ainda ponderar que o desafio da sucessão no agronegócio e o desinteresse dos jovens pela vida rural representam um ponto de inflexão na trajetória do setor agropecuário, e por conseguinte, na história do Brasil e de cada um de nós, filhos brasileiros.

A continuidade das atividades agropecuárias não é apenas responsabilidade das famílias envolvidas, mas também uma preocupação que deveria envolver toda a sociedade. A sustentabilidade do setor agroindustrial tem um impacto direto na economia, na segurança alimentar e no desenvolvimento do país como um todo. Portanto, a necessidade de garantir a sucessão nas propriedades rurais e o engajamento dos jovens nesse processo não apenas preserva as tradições familiares, mas também mantém a base da economia e o bem-estar coletivo.

Ana Lacerda é advogada do escritório Advocacia Lacerda e escreve exclusivamente nesta coluna às quartas-feiras. E-mail: analacerda@advocacialacerda.com. Site: www.advocacialacerda.com



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