Não tem mais volta | …

Olga Lustosa

Apesar de estarmos vivenciando catástrofes climáticas, a maioria das pessoas dá de ombros quando se discute o futuro do nosso planeta. Há uma explicação psicológica para isso; não fomos projetados para permanecer em um estado de aflição e medo por muito tempo.

O físico Paulo Artaxo, pesquisador da USP, membro do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, vinculado a ONU disse em entrevista recente que o relatório do Painel Brasileiro, que fizeram há oito anos mostrou que haveria o risco de chuvas extremas no Sul do país e nada foi feito pelos governos para prevenir a ameaça anunciada. Um dos mais brilhantes cientistas brasileiro, o climatologista Carlos Nobre, que fez carreira no INPE – Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, pesquisador do Instituto de Estudos Avançados da USP, diz que nesse cenário de aquecimento global, as previsões para a região Sul do Brasil são aumento de 10% a 20% da chuva anual e em todo o resto do Brasil, a previsão é de diminuição da chuva e seca.

A ação predadora aconteceu paulatinamente, durante anos, num tempo em que temos equipamentos precisos de monitoramento e controle, ação fiscalizadora presencial e tudo mais

O cientista Carlos Nobre diz que a capacidade de previsão meteorológica avançou muito e que fenômenos extremos estão sendo previstos com vários dias de antecedência mas, alerta que os governos precisam melhorar muito seus sistemas de respostas, senão, as tragédias serão cada vez maiores. Nobres diz que eventos extremos como o que ocorreu no Rio Grande do Sul, não tem mais volta e vão acontecer com frequência, causando deslizamentos, enxurradas e muitas mortes, as secas trarão problemas de abastecimento de água, queda de produtividade da agricultura.

Depois da tragédia ocorrida no Rio Grande do Sul, na véspera do Dia Mundial do Meio Ambiente, a Assembleia Legislativa realizou um seminário em Cuiabá para discutir a questão das mudanças climáticas, falar sobre os objetivos traçados pela ONU para reduzir as catástrofes. As discussões de forma transversal relacionavam o recrudescimento das mudanças climáticas às práticas permanentes de corrupção dos governos, através dos subornos recebidos para fechar os olhos diante de destruição causada em grandes áreas, pela falta de política pública para retirar famílias inteiras que vivem em áreas de risco.

Se o governo não se preocupa, o público responde com a mesma indiferença. Mesmo com bons palestrantes da Unemat e outras instituições, com exposição de práticas sustentáveis desenvolvidas em escolas públicas pela Unemat poucas pessoas compareceram. Enfim, o palco estava repleto de bons técnicos mas as cadeiras da plateia estavam vazias, porque o cidadão, ainda não está disposto a levantar sua voz para cobrar do governo, em todas as esferas e das grandes empresas, a adoção de práticas de desenvolvimento sustentável.

Mato Grosso deveria ter despertado depois de divulgadas as ações predadoras do fazendeiro, que sozinho causou um dano hipoteticamente impossível de ter ocorrido sem ter sido percebido por algum órgão de controle. O cidadão gastou a fortuna de 25 milhões para promover desmate químico em 81 mil hectares no meio do Pantanal Mato-grossense e ao ler a história do pedido de prisão do pecuarista pelo Ministério Público, as autoridades fizeram cara de espanto, diante de um caso que não ocorreu em um dia.

A ação predadora aconteceu paulatinamente, durante anos, num tempo em que temos equipamentos precisos de monitoramento e controle, ação fiscalizadora presencial e tudo mais…A reação pública sobre o gigantesco desmate foi um silêncio constrangedor, sobretudo diante de informações sobre aplicação de multas aplicadas e contestadas num passado recente. Enfim, nenhuma ação de chega, basta!

Todos enfrentamos diariamente escolhas que acarretam um custo climático de baixo ou elevado impacto. Fala-se muito hoje em dia sobre a necessidade de levarmos estilos de vida o mais sustentável possível. Isso não significa viver sem carros, não precisamos ser vegetarianos. A ação individual é importante e a questão central é concentrar-se nas escolhas. Precisamos de mudanças sistêmicas que reduzam a pegada de carbono de todos, de quem se preocupa com as mudanças climáticas e de quem as nega.  

Olga Lustosa é socióloga e cerimonialista pública. Escreve com exclusividade para esta coluna aos domingos. E-mail: olgaborgeslustosa@gmail.com.



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