Em depoimentos, PMs dizem que quase foram mortos por golpistas no 8 de janeiro; veja vídeos


Policiais apontaram inferioridade numérica e discordâncias com Exército como fatores para demora em conter avanço dos vândalos. Declarações foram enviadas pela Justiça do DF à CPI dos Atos Golpistas. Vândalos são vistos através de janela vandalizada do Palácio do Planalto, em Brasília, em 8 de janeiro de 2023
Adriano Machado/Reuters
Policiais militares afirmaram à Justiça do Distrito Federal que foram agredidos e enfrentaram dificuldades para conter a invasão de vândalos golpistas ao Palácio do Planalto no dia 8 de janeiro, em Brasília.
As declarações integram material — obtido pela TV Globo e sob posse da CPI dos Atos Golpistas — de uma investigação da Corregedoria da Polícia Militar do DF para apurar uma suposta lesão corporal contra um vândalo.
O acusado no processo é o segundo-tenente Marco Aurélio Feitosa, que comandou uma das tropas do Batalhão de Choque da PM no combate às invasões da Esplanada dos Ministérios.
As testemunhas apresentadas pelo segundo-tenente no processo apontaram o número insuficiente de policiais como um dos motivos para um primeiro insucesso na operação.
Segundo Marco Aurélio Feitosa, a tropa tinha, ao todo, 20 homens, além de 16 voluntários. Do outro lado, os policiais estimaram a presença de 200 vândalos na sede da Presidência da República.
“Esse era todo o efetivo escalado pelo BPChoque, por ordens superiores, para o dia”, declarou.
Comandante da tropa da PMDF que foi ao Planalto no 8 de janeiro fala sobre operação
Feitosa pontuou, porém, que inicialmente os policiais não deveriam estar no local.
De acordo com ele, a tropa havia recebido ordem para permanecer posicionada em um hotel na Região Central de Brasília. Por decisão do segundo-tenente, o grupo se deslocou ao Congresso Nacional.
“Fui inicialmente repreendido […] Relatei que era iniciativa minha, que se ele determinasse que eu voltasse, eu voltaria. Mas que, no meu entender, a Tropa de Choque tinha que estar próxima ao Congresso”, afirmou.
A ausência de reforços, a escassez de materiais e a superioridade numérica dos golpistas foram apontadas pelos policiais como fatores para o insucesso do embate.
Dois policiais ouvidos no processo disseram ter sofrido lesões: a cabo Marcela Pinno e o subtenente Beroaldo José de Freitas Júnior.
Imagens mostram que os dois caíram de uma altura de quase três metros e foram agredidos por golpistas no Congresso.
Em depoimento, o subtenente disse quase ter sido morto. Ele classificou o episódio como o “pior de todos” os “distúrbios civis no Distrito Federal”.
Subtenente da PMDF diz que ‘quase foi morto’ durante ataques de 8 janeiro
“O clima no interior era de caos. A gente fala que é de caos total. Até porque a nossa tropa estava com aproximadamente 20 homens – talvez um pouco mais ou pouco menos. Mas acredito que eram mais de 200 de pessoas lá no interior do Palácio. E nós já tínhamos enfrentado eles lá fora. O ânimo deles era totalmente agressivo. Inclusive, eu quase fui morto. Eu e a soldado Marcela quase morremos nesse confronto, nesse primeiro momento. Estava ferido, fui socorrido depois disso todo ensanguentado, porque nem sabia que estava ferido. Mas depois fui identificado como lesionado.”
O subtenente afirmou que policiais machucados somente puderam buscar atendimento de saúde após o confronto ter sido pacificado. De acordo com ele, PMs com ferimentos leves, no entanto, seguiram atuando na operação.
“Já tive vários confrontos, muito duros, difíceis. Inclusive, aquele que tomaram o Itamaraty e botaram fogo. Ali a gente achava que seria um dos marcos dos distúrbios civis no Distrito Federal. Mas esse do dia 8 é incomparável. Não dá nem pra ter uma ideia. Foi o pior de todos”, completou.
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Embate com Exército
Os depoimentos também apontam uma suposta inércia de militares do Exército como outro fator para a demora em conter os vândalos.
Além de Feitosa e o subtenente Beroaldo, o tenente Diego Alves Valença Pereira narrou embates entre o comando da tropa da PM e o pelotão do Exército lotado no Batalhão da Guarda Presidencial (BGP).
As declarações convergem sobre o clima e a suposta resistência de militares do Exército a efetuar prisões durante a invasão do Palácio do Planalto.
Vídeos divulgados em janeiro já indicavam que militares do Exército dificultaram a ação da PM no episódio.
No depoimento, Valença afirmou que a tropa liderada por Marco Aurélio Feitosa foi hostilizada na chegada ao edifício.
“Ao tentar adentrar ao edifício, sentimos uma certa resistência dos oficiais do Exército e outros militares do Exército que lá estavam. E aí, teve até um embate ali entre o nosso comandante com o oficial do Exército, que estava comandando naquele momento”, disse.
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Ao ser ouvido, o subtenente Beroaldo detalhou o motivo do embate. Segundo ele, por ação de militares do Exército, vândalos chegaram a deixar o Planalto pela “porta dos fundos”.
“No interior, era um caos. Nós tivemos um pouco de dificuldade de controlar aquelas pessoas para que elas viessem a obedecer aos comandamentos da Tropa de Choque, para que se mantivessem imóveis e que a gente ia efetuar a prisão de todos eles. Até porque, antes disso, teve um embate entre a PM e o Exército. O Exército queria liberar todos eles. Inclusive, vários foram soltos pela porta dos fundos do Palácio. Por decisão nossa, da Tropa de Choque, do nosso comandante, que nós não iríamos participar disso. Quem estava ali, estava preso.”
“A gente [teve] dificuldade de controlar [os vândalos] – até pelo número de policiais, que era muito inferior no Palácio. E, além disso, estávamos com dificuldade com o Exército, que não queria que a gente efetuasse as prisões. A gente estava com dois flancos de negociação: com quem tava preso e com o Exército que estava no interior e dificultando de certa forma”, destacou o subtenente.
Subtenente da PMDF fala sobre divergências entre PMs e Exército no 8 de janeiro
O comandante da tropa endossou as declarações. De acordo com ele, havia, por parte do Exército, “conivência” com “essa tentativa de fuga”.
“Nós detivemos todos, contra vontade de oficiais do Exército, e mandamos que eles [vândalos] deitassem”, disse.
Em seu depoimento, Marco Aurélio Feitosa narrou, ainda, que, antes de entrar no Planalto, teve negado um pedido de apoio a um pelotão do Exército, localizado na entrada do Palácio.
“Fomos atacados com uma violência que eu não imaginava viver. Imaginei que só veria em livros. Fomos repelidos até a primeira guarita do Planalto, onde estava pelotão do Exército. Nesse momento, estávamos aos frangalhos e pedimos intervenção deles. Estávamos superados em números e materiais. Materiais estavam se esgotando rápido. Inicialmente, recebemos resposta negativa do pelotão do Exército. Eles só começaram a operar quando os vândalos começaram a pular os gradis do Palácio do Planalto, na N1, próximo ao Congresso e começarem a correr em direção ao Palácio”, afirmou Feitosa.
Além da inércia, o comandante da tropa que atuou no Planalto também indica desencontros nas ações do Exército durante o ataque.
PM do DF diz que teve pedido de apoio ao Exército negado durante confronto no 8 de janeiro
Segundo ele, militares chegaram a largar escudos e correr em direção oposta ao confronto.
“Nós precisamos grudar pela farda e colocar de volta. Não estávamos conseguindo lidar com a situação, e eu precisei assumir o comando do pelotão do Exército”, declarou.
Nos depoimentos, os PMs indicaram que, somente após discordarem da ordem do Exército, foi possível dar início a ações e prisões para conter os vândalos.

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