Rodinei Crescêncio/Rdnews
Às vezes com nomes estrangeiros de enrolar a língua, os coquetéis (drinks) são opções ao costume da tradicional caneca de chope congelada. Alguns tipos são clássicos em cardápios de bares mato-grossenses e do país, como a Caipirinha – cachaça, açúcar e limão –, Moscow Mule – vodca, suco de limão, xarope de açúcar e gengibre – e Sex on The Beach – vodca, suco de laranja e abacaxi e licor de framboesa.
Entretanto, a demanda por combinações originais e destilados mais aromáticos tem crescido e despertado um novo mercado para além da caipirinha. Apesar de já possuir produção de cachaça regional, Mato Grosso também vem adquindo know-how na fabricação de Gin, Rum e Vodca. Esse tipo de empreendimento estão presentes tanto na Capital, quanto no interior.
Segundo o levantamento da Euromonitor, o consumo de Gin no Brasil aumentou de 1,1 milhão de litros em 2016 para 13,1 milhões em 2021. A previsão da autora da pesquisa é que a demanda pela bebida chegue aos 35,1 milhões de litros em 2026.
Pioneiros, a Cervejaria Xaraés, de Chapada dos Guimarães (a 67 km de Cuiabá), lançou a trilogia XGin em agosto de 2023 após breves adequações na planta fabril. Os rótulos lançados pela marca – Nascentes, Paredões e Trilhas – seguem a inspiração da flora do município, assim como exaltam notas de especiarias e cítricos.
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O gerente fabril Matheus Miki detalha que o surgimento dos rótulos partiu mais de uma oportunidade de mercado do que de uma paixão por coquetelaria.
“A gente já tinha os registros para a produção de bebidas alcoólicas fermentadas e vimos a possibilidade de incorporar outros tipos de bebida, como o caso das bebidas retificadas, entrando o Gin. Logo, nós trabalhamos um pouco mais com um portifólio de produtos, atacando um nicho, trazendo a nossa identidade”, conta Miki.
O Gin não é um destilado simples. Como Matheus mencionou, as bebidas *retificadas* são aquelas que passam por um processo de retificação entre a fervura no alambique e a condensação no resfriador.
Após aquecida até a fervura, o álcool de cereais infusionado com zimbro e outras especiarias passa pelos pratos retificadores, que purificam os aromas a medida com que o vapor é aquecido. Com isso, o vapor purificado é condensado e transforma-se em Gin. Posteriormente a parte mais complicada, a bebida é misturada com água para abaixar a graduação alcóolica, estabelecendo o teor de 35% até 54%, conforme normas do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa).
Conhecido pela refrescância, os aromas de um Gin podem depender de cada produtor. No caso da trilogia XGin, as notas esperadas são de anis estrelado, cardamomo e hibisco.
A exploração de um novo nicho de mercado rendeu a Xaraés mais prêmios. Além das medalhas nas cervejas, os Gins Paredões, Nascentes e Trilhas receberam as medalhas de ouro, prata e bronze, respectivamente, do World Gin Awards.
“A gente tentou buscar uma frente que, no Mato Grosso, ainda não tinha. A gente não tem tanta destilaria em no estado e isso é uma oportunidade. Apesar de parecer pequeno o mercado para drinks, essa demanda também existe e não existia um produto mato-grossense para suprir esse público”, detalhou Matheus.
Rum volta à cena
Também produtora de Gin, a Dourada Cervejaria expande o leque nos destilados com a produção de vodca e testes para uma receita própria de Rum. Em operação com nova gestão há um ano, o destilador com pratos de retificação já era propriedade da fábrica e Mauro Henrique, mestre cervejeiro e destiler, resolveu testar as possibilidades até chegar no Rum.
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Mauro Henrique, da Dourada Cervejaria, inova e começa aposta no Rum, uma bebida que não é comum no Brasil
Produzido a partir do melaço da cana-de-açúcar, o Rum, uma bebida muito comum na América Central, é um destilado simples, ou seja, sem passar pela retificação, sem a sensação de queimação deixada pela cachaça. Ao final do processo de destilação, a bebida é envelhecida por dois anos em dornas de padronização.
A iniciativa de produção de Rum na Dourada partiu de oportunidade de apresentar uma opção ao Gin, tão versátil quanto.
“A ideia da produção do Rum veio, principalmente, dessa onda no mundo da coquetelaria dele “ser o novo Gin”. Vemos que tem surgido uma demanda maior do que o esperado pela bebida e entramos com o projeto. Na nossa receita de rum, a gente pensou em deixar características que lembrem um pouco a cachaça, como o aroma do melaço, mas só que sem queimar”, comentou Mauro.
Dentro da produção de destilados da cervejaria, a empresa possui planos de comercialização tanto para o consumidor final, quanto para os bares e restaurantes locais.
Na mesma lógica da Xaraés, a Dourada enxerga um mercado pequeno, mas ainda uma demanda a ser suprida. No caso do Rum, o objetivo é contemplar o público com uma bebida de guarda, para quem gosta de uísque, inserindo-a no ramo da coquetelaria.
“Pode-se dizer que o Rum já teve seu tempo de ouro. A galera mais antiga sempre fala que o Rum fez parte da adolescência e ele tem tomado mais espaço agora. A gente acredita que conseguimos inserir o Rum no mercado, porque ele vai ir junto com a coquetelaria e em coquetéis enlatados. Já existe uma bebida chamada Xeque-mate, que tem Rum, e queremos testar variantes dela por aqui”, discorreu Mauro.
Bebendo com os olhos
A produção regional de destilados beneficia pequenos empreendedores locais, como é o caso de Janison Tavares, proprietário da Casa Pro Coquetéis, no centro de Cuiabá. Após mais de 15 anos no exterior, entre Estados Unidos, Irlanda e Inglaterra, Janison se especializou em mixologia e atende eventos no Brasil desde 2021. A loja física, no entanto, só foi inaugurada em 2023.
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A Casa Pro possui receitas exclusivas de Gin e Vodca produzidas pela Dourada Cervejaria. Os destilados são usados para fabricação dos coquetéis engarrafados, de acordo com as fórmulas criadas por Janison. Após a temporada no estrangeiro, o especialista vê com bons olhos conseguir unir-se a produtores locais, visto que já era uma prática consolidada quando morava em Londres.
“Eu acho muito legal a gente dar valor aos nossos produtos locais. Lá na Inglaterra a gente tinha muito disso. Faz mais sentido você promover o seu vizinho, o seu amigo, fomentando a economia local. Lá fora eles fazem isso, por que não vamos fazer também? O brasileiro tem essa de achar que o que é mais caro é melhor, mas não é bem assim”, explicou Janison.
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Janison Tavares, proprietário da Casa Pro Coquetéis, no centro de Cuiabá: público jovem é bastante exigente
Atualmente, a Casa Pro possui cerca de 80 opções no cardápio de drinks, com poucas opções de aperitivos. Desse total, 16 são com vodca e outras 14 com Gin, utilizando ingredientes como pistache, paçoca e chá verde. Os drinks que são oferecidos no bar também podem ser adquiridos em garrafas de um litro, as quais rendem oito porções.
Especializada em coquetéis, a Casa Pro experimenta na ponta das demandas sentidas pelos produtores. Atualmente, o carro-chefe da empresa é o Porn Star Martini, um coquetel com bases de Vodca de baunilha e maracujá, com enfeite de physallis. Janison comenta que o público do bar, que é mais jovem, tem se revelado exigente e pede por drinks com qualidade.
“O pessoal é muito crítico em relação a qualidade, já que eles têm preferido coisas mais elaboradas, aí entra o coquetel. Que são coisas já relacionadas a aromas, sabor e que despertam a curiosidade. A receita tem que ter o equilíbrio. Não dá para usar qualquer destilado, por isso temos a nossa receita de Gin junto com a Dourada”, explica.
Ao se conversarem, a coquetelaria regional ganha espaço e prospecção a partir do vínculo com fornecedores locais. Logo, o surgimento de coquetéis com jabuticaba, açaí e outro sabores mais próximos de Mato Grosso do que especiarias orientais podem vir a ser os destaques dos cardápios ao invés das caipirinhas.
Acompanhe mais da produção nos perfis dos entrevistados: @procoqueteis, @douradacervejaria e @cervejariaxaraes.