A partir desta terça-feira (24), será ilegal possuir ‘facas-zumbi’ e facões na Inglaterra e no País de Gales. Faron Paul (esq.), fundador de uma iniciativa pelo desarmamento, recebe uma lâmina de ‘Matthew’ (dir.)
BBC
Comprar uma “faca-zumbi” — tipo de faca ornamental ou arma branca, inspirada em filmes e séries de TV sobre zumbis — é tão fácil quanto pedir comida por aplicativo, diz o britânico Matthew, de 20 anos. Ele adquiriu sua primeira faca, no estilo “Rambo”, aos 16.
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Numa estrada tranquila ao sul de Luton, ao norte de Londres, Matthew — nome fictício — afirma que “todo mundo” anda com uma faca.
“As pessoas acham que precisam”, explica ele, usando uma balaclava. “Se você tem um canivete e alguém aparece com uma Rambo, você vai pensar: ‘Por que não arranjo uma maior?'”
“Se você tiver a arma maior, tem mais chances. Se minha faca for maior que a deles, eu vou vencer.” No entanto, Matthew diz que está pronto para se desfazer dela.
“Você amadurece. Percebe que não vale a pena, eu já perdi pessoas.”
A partir desta terça-feira (24), será ilegal possuir “facas-zumbi” e facões na Inglaterra e no País de Gales.
A nova legislação fechará uma brecha e tornará crime passível de prisão a posse, fabricação, transporte ou venda de uma grande variedade de facas “de exibição” preferidas por gangues criminosas.
Facas estilo “zumbi” e outros facões são classificados como armas com lâminas de mais de 20 cm de comprimento, geralmente com bordas serrilhadas.
Um esquema de anistia e compensação está em vigor, incentivando as pessoas a entregarem suas armas antes que a proibição entre em vigor.
No Reino Unido, o acesso a armas de fogo pela população é altamente regulamentado e sujeito a rigorosas medidas de controle.
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‘Vejo muitas facas Rambo e zumbi’
Mas Matthew não vai entregar seu facão à polícia. Em vez disso, ele decidiu entregá-lo a Faron Paul, um ativista que administra uma iniciativa para recolher facas.
Faron, que quase perdeu a vida após ser esfaqueado, conhece bem os efeitos devastadores do crime com facas. Ele viaja pelo Reino Unido coletando centenas de armas de pessoas que desejam se desfazer delas, entregando-as à polícia ou as destruindo.
“Vejo muitas facas Rambo e zumbi”, diz Faron à BBC News. “São as mais comuns que vejo. Recebo tantas mensagens de todo o Reino Unido que é difícil acompanhar.”
Desde 2018, Faron opera esse serviço de anistia e diz que as facas estão ficando cada vez maiores.
Dados obtidos pela BBC indicam que crimes com armas brancas de grandes lâminas têm crescido no Reino Unido.
O número de crimes registrados que mencionam facões, espadas ou “facas-zumbi” quase dobrou em cinco anos, de acordo com informações obtidas por pedidos via Lei de Acesso à Informação.
Em 2023, essas armas foram mencionadas em mais de 14 mil registros criminais, conforme dados de 32 distritos policiais na Inglaterra e no País de Gales.
Facões representaram quase 10 mil desses casos, o dobro do número registrado cinco anos antes.
Embora a nova legislação inclua facões e outras lâminas grandes, ela não abrange todas as espadas.
Pooja Kanda, mãe de Ronan Kanda, de 16 anos, que foi assassinado em um ataque com espada em Wolverhampton em junho de 2022, tem feito campanha para que a venda online de todas as facas grandes seja proibida.
“Uma espada atravessou o coração do meu filho. Fico chocada que elas estavam disponíveis quando isso aconteceu, e mais chocada ainda que continuam sendo vendidas após o ocorrido com Ronan”, diz ela.
O governo começou a registrar o tipo de lâmina envolvida em homicídios em abril de 2022.
No primeiro ano de dados disponíveis, 244 assassinatos na Inglaterra e no País de Gales envolveram instrumentos cortantes, sendo 14 com machetes, sete com facas zombie e três com espadas. Facas de cozinha foram as mais utilizadas, sendo responsáveis por 101 homicídios.
Nikita, irmã de Ronan, afirma que os jovens estão cada vez mais atraídos por facas maiores.
“É sobre a cultura que envolve a venda de machetes, facas zombie e espadas”, comenta ela. Nikita acredita que o adolescente que matou Ronan foi “atraído” por grandes facas.
Ela culpa a facilidade de compra dessas armas online.
‘Fácil de comprar, difícil de entregar’
Faron se encontrou com Jon, que comprou suas facas para proteção, mas decidiu entregá-las
BBC
Em Londres, Faron está a caminho de recolher dois facões de um jovem de 21 anos, “Jon” (nome fictício), que os comprou após ser sequestrado e esfaqueado 12 vezes em 2022 por ex-colegas de escola que queriam dinheiro.
“Eu estava voltando para casa à noite quando me levaram para um campo”, conta Jon.
“Eles queriam que eu dissesse onde estava o dinheiro [da loja onde trabalhava], provavelmente por causa do meu Instagram.”
Jon relata que foi cortado com um facão no braço e esfaqueado na coxa, quase atingindo uma artéria importante. Após o ataque, ele decidiu comprar “algo do mesmo tamanho” para se proteger, mas agora acredita que isso não é mais necessário.
Faron observa que muitas facas que recebe são tão grandes que não cabem nas caixas de coleta distribuídas pelas delegacias de Londres.
Mesmo com a nova lei e o esquema de anistia, Faron diz que muitas pessoas ainda têm medo de entregar suas armas na polícia. Muitos jovens sentem-se inseguros ao ir a delegacias.
As facas de Jon são apenas algumas das dezenas que Faron recolheu recentemente.
O Ministério do Interior declarou que, além da nova legislação, há planos para proibir espadas ninja. O governo também está revisando a venda de facas online, com um relatório previsto para o final do ano.
Essa revisão buscará identificar falhas na legislação que permitem a compra ilegal dessas armas pela internet.
Jon confirma que foi “fácil” comprar suas facas online.
“Eram as mais baratas que encontrei, e não houve verificação de identidade. Fiz o que achei necessário.”
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