Segundo a ONG “Coletivo Frente Afegã”, 70 afegãos estão no saguão do Aeroporto Internacional, em Guarulhos. Até 14 de junho de 2023, governo autorizou a concessão de 11.576 vistos de acolhida humanitária em favor de afegãos. Afegãos recém-chegados ao Brasil com visto humanitário dormem no Aeroporto de Guarulhos
Reprodução/TV Globo
Os afegãos que chegaram nos últimos sete dias ao Brasil e que estão acampados no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos, demoraram um ano para conseguirem comprar as passagens com destino a São Paulo, segundo a voluntária Aline Sobral, do Coletivo Frente Afegã.
Até esta quarta-feira (16), 70 pessoas, entre elas 29 crianças, estavam nos saguões do aeroporto à espera de acolhimento.
“Este novo grupo tem menos poder aquisitivo. Estavam com o visto humanitário desde o ano passado, mas não conseguiram arrecadar dinheiro para virem antes. A maioria estava já fora do Afeganistão, em países como Paquistão e Irã. Mas o desespero por lá aumentou com essas novas ações do Talibã”, diz Aline, que acompanha a chegada dos grupos.
Aline conta que a maioria conseguiu visto humanitário para o Brasil depois de entrar clandestinamente no Irã.
“Lá, eles recebem visto temporário de 180 dias, que é o período que ficam tentando vistos para o Brasil ou outros países. Quando conseguem, vivem a ‘via sacra’ para conseguirem grana para irem a esses países que os aceitam. É puxado demais. E mesmo acampados, ouvi de muitos: aqui está melhor do que lá”, ressalta a voluntária.
Afegãos no Aeroporto de Cumbica, em Guarulhos
Fábio Tito/g1
A prefeitura de Guarulhos informou, na última segunda-feira (14), que possui atualmente 177 vagas para acolhimento de migrantes e refugiados, sendo 127 geridas pela municipalidade e outras 50 pelo governo estadual.
“No momento, todas estão lotadas. A Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Assistência Social está em contato com os governos estadual e federal e também com instituições parceiras buscando vagas para acolhimento, mas não há previsão no momento”.
Afegãos acampados no Aeroporto de Guarulhos
Arquivo Pessoal
O g1 acompanha desde o ano passado a chegada dessas famílias afegãs, que começaram a entrar no país quando as tropas americanas encerraram os 20 anos de intervenção militar no Afeganistão e o grupo extremista Talibã voltou ao poder.
O governo brasileiro publicou em setembro de 2021 uma portaria estabelecendo a concessão de visto temporário, para fins de acolhida humanitária, a cidadãos afegãos.
Conforme a agência de notícias internacional RFI divulgou, quase 2 milhões de pessoas saíram do Afeganistão desde 2021, o que representa 4% da população. Além disso, conforme a ONU, ao menos uma mulher se suicida por dia no país.
“Estamos alarmados com os problemas de saúde mental generalizados e os relatos de suicídios crescentes entre mulheres e meninas”, escreveram Dorothy Estrada-Tanck e Richard Bennett, pesquisadores da ONU, em um relatório divulgado em maio sobre a situação no país.
Afegãos no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos
Reprodução/TV Globo
Aline Sobral afirma que ainda há imigrantes para entrar no Brasil. Por isso, ela acredita que sem uma medida para abrigos temporários, os afegãos vão continuar acampados no aeroporto.
“Sem uma medida efetiva não cessará. Precisamos de um local provisório com estrutura”, ressalta a voluntária Aline Sobral.
Afegãos voltam a ficar acampados no Aeroporto de Guarulhos, em 14 de agosto
Arquivo Pessoal
Acolhida humanitária
2 anos de Talibã: afegãos continuam chegando ao Aeroporto de Guarulhos
A política de acolhida humanitária permanece em vigor. Até 14 de junho de 2023, o governo brasileiro autorizou a concessão de 11.576 vistos de acolhida humanitária em favor de afegãos.
Do total de autorizados, 9.003 vistos foram efetivamente entregues aos requerentes, segundo informou o Ministério de Relações Exteriores ao g1.
No dia 19 de julho, dezenas de mulheres foram dispersadas com jatos de água quando protestavam em Cabul, no Afeganistão, contra a decisão do governo talibã de fechar os salões de beleza.
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Desde seu retorno ao poder em agosto de 2021, o Talibã implantou uma série de restrições para as mulheres. Além dos centros de estética, as afegãs não podem entrar em diversos estabelecimentos, como parques, jardins, estádios e banheiros públicos.
No ano passado, o Alto-comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur) atendeu 1.035 pessoas afegãs.
A maioria era composta por homens entre 18 e 59 anos (490) e mulheres na mesma faixa etária (248). Dessas 738 pessoas, 50,4% possuem formação universitária e 6,5% são pós-graduadas.
Afegãos no Aeroporto de Guarulhos
Reprodução/TV Globo
O ministro da Justiça Flávio Dino afirmou no dia 1º de julho, durante entrevista ao Jornal Hoje, que a questão dos vistos humanitários seria debatida.
“Nós temos uma capacidade naturalmente limitada, por isso haverá debate com outros órgãos do governo para ver se essa política de 2021 irá continuar ou não. O fato é que temos demanda previsível porque houve entrega de 9 mil vistos. Lembro que nós temos 5 milhões de brasileiros morando em outros países, e isso impõe deveres de reciprocidade, por isso houve a decisão, e temos capacidade de atender esse número. A continuidade dessa política dependerá desse debate que ocorrerá”, ressaltou Dino.
“Quanto aos vistos já concedidos, é claro que vamos montar rede necessária para acolher essas pessoas, uma vez que houve entrega dos vistos, já que algum momento essas pessoas cheguem ao Brasil. Temos lei brasileira de migrações, temos obrigações previstas e compromisso internacional do Brasil. É uma política necessária de acolhida. Precisamos garantir a lei ao que estão no território nacional e os que vão chegar nos vistos concedidos”, ressaltou o ministro.
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‘Cidade fronteira’
Afegãos voltam a acampar no Aeroporto Internacional de SP, em Guarulhos
Fabio Tito/g1
A prefeitura de Guarulhos protocolou pela segunda vez, em junho deste ano, um ofício ao Ministério de Portos e Aeroportos para que o município possa ser reconhecido como “cidade fronteira do Brasil” devido à chegada frequente de afegãos ao país desde o ano passado.
O documento foi protocolado no dia 13 de junho pelo prefeito Gustavo Henric Costa. Outros órgãos, como Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, Ministério da Justiça e Segurança Pública, Casa Civil e a Organização das Nações Unidas também receberam.
A expectativa da prefeitura é a de que, sendo reconhecida como cidade fronteira, Guarulhos passe a ter acesso a verbas e a recursos que são característicos de políticas públicas de lugares que recebem e acolhem refugiados, como cidades que fazem fronteira com países que estão em guerra.
Não há países ao lado de Guarulhos, mas a chegada dos refugiados em grande quantidade coloca a cidade em uma situação similar.
“A intenção é reforçar a solicitação de reconhecimento da cidade como fronteira do Brasil e maior apoio financeiro para alimentação daqueles que permanecem no aeroporto aguardando acolhimento”, disse prefeitura.
“Apesar desta questão não ser de responsabilidade do município, a Prefeitura de Guarulhos informa que segue acompanhando a situação dos afegãos acampados. Inicialmente não dá para se prever o fluxo de refugiados que ainda podem desembarcar em Guarulhos ao longo deste ano. Para acomodar as pessoas que chegam em grande número depende de muitos recursos que extrapolam a capacidade do município, sendo necessário aportes do Estado e do Governo Federal. Na atual conjuntura dificilmente esse número de pessoas no aeroporto será zerado sem a intervenção governamental”, ressaltou a prefeitura, em nota.
Afegãos no Brasil
Jornalista afegão com sua mulher e filhos na chegada ao Brasil
Fábio Tito/g1
O Brasil passou a ser um dos principais destinos para os cidadãos do Afeganistão após o governo brasileiro publicar uma portaria em setembro de 2021 estabelecendo a concessão de visto temporário.
Quase 3 mil afegãos entraram no Brasil de janeiro a setembro de 2022, de acordo com um relatório elaborado pelo Observatório das Migrações Internacionais (OBMigra) a partir dos dados da Polícia Federal e repassado com exclusividade ao g1 no ano passado.
Os dados apontam que o país recebeu 2.842 imigrantes. Destes, 1846 são homens e 993 mulheres. Outros três imigrantes não houve a constatação de gênero. Além disso, a grande maioria que entrou no Brasil tem entre 25 e 40 anos. Há também 712 crianças de 0 a 15 anos.
Ainda conforme o relatório, dos 2,8 mil que entraram no país, 149 já saíram do Brasil e a maioria desse grupo tem entre 25 e 40 anos.
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