Com seca, indígenas temem falta de alimentos e aumento de queimadas | …

Marizilda Cruppe/Anistia Internacional

Inc�ndio na Terra Ind�gena Manoki em 2019

Incêndio registrado em 2019 na Terra Indígena Manoki, situada a 100 km da cidade de Brasnorte, no noroeste do Mato Grosso

Com a redução do volume de chuvas e a previsão de seca para esse ano, indígenas mato-grossenses se preocupam com a possível falta de alimentos e com o aumento das queimadas em seus territórios. As queimadas já apareceram mais cedo em 2024 e o número de focos de calor triplicou nas Terras Indígenas e em seu entorno. O aumento foi de 280% dentro dos territórios e de 145% no raio de 10 km em volta deles.

De acordo com o Monitor de Secas da Agência Nacional de Águas (ANA), em Mato Grosso, devido às chuvas abaixo da normalidade, em março houve o avanço da seca grave no sudeste e no leste mato-grossense. No noroeste, a seca está extrema. Os impactos são de curto e longo prazo, desde a agricultura e pastagem à ecologia e hidrologia.

“As nossas lideranças [indígenas] alertaram que terá uma seca esse ano porque o rio não bebeu, não choveu o suficiente. Estamos todos preocupados porque vai faltar água. Vimos que tem mais de 30 cidades em alerta para a seca. O Pantanal não teve cheia suficiente. Ele precisa de três cheias no ano e está tendo a primeira agora. O Pantanal depende do Cerrado e o Cerrado está desmatado”, afirma Eliane Xunakalo, presidente da Federação dos Povos e Organizações Indígenas de MT (Fepoimt).

Rodinei Crescêncio/Rdnews

Eliane Xunacalo Fepoi-MT

Eliane Xunacalo,  presidente da Federação dos Povos e Organizações Indígenas de MT (Fepoimt)

Alimento insuficiente

A Fepoimt representa 58 mil indígenas de 45 etnias em sete regiões de Mato Grosso: Cerrado/Pantanal, Kayapó Norte, Médio Araguaia, Noroeste, Xavante, Vale do Guaporé e Xingu. Os povos indígenas da região do Pantanal e do Noroeste são os que mais sofrem com a seca atualmente, mas todos estão preocupados.

O setor do agro está chorando as mesmas pitangas que nós, foram atingidos do mesmo jeito, mas eles vão ter incentivo do Governo e nós, não. E mais uma vez teremos problemas sociais e desnutrição porque não teremos soberania alimentar


Eliane Xunacalo

“As nossas roças tiveram que ser plantadas de novo. Vamos ter problema alimentar porque está tendo pouco. O cará, a mandioca, o milho e o arroz não vingaram. Não vamos ter o suficiente para farinha e outros alimentos. Muitos de nós, a roça não prosperou mesmo replantando. O setor do agro está chorando as mesmas pitangas que nós, foram atingidos do mesmo jeito, mas eles vão ter incentivo do Governo e nós, não. E mais uma vez teremos problemas sociais e desnutrição porque não teremos soberania alimentar”, argumenta Eliane.

Além da falta de alimentos, a preocupação é com a destruição causada por queimadas todos os anos e a seca preocupa que esse período comece antes e com maiores estragos.

“Os fazendeiros já começaram a fazer a limpa para o plantio, abrir novas áreas, significa que o desmatamento está aumentando. Eles vão colocar para secar toda essa sujeira e vão queimar em algum momento. Achamos que vão queimar mais cedo, geralmente os incêndios começam em julho e agosto, e achamos que vai começar mais cedo, em maio, se continuar seco do jeito que está”, afirma.

Focos aumentaram

Os dados do Instituto Nacional de Pesquisa Espaciais (Inpe) confirmam o receio da presidente da Fepoimt. De janeiro até o dia 10 de abril deste ano, foram registrados 61 focos de incêndio em Terras Indígenas (TIs) de Mato Grosso, quando no mesmo período do ano passado foram 16 focos. Já em seu entorno, em um raio de até 10 km, foram notificados 277 neste ano e 113 no ano passado, aumentos expressivos.

Kamikia Kisedje/Repórter Brasil

inc�ndio na TI Xingu em 2020

Incêndio na Terra Indígena Xingu em 2020: TI foi uma das mais devastadas pelo fogo naquele ano

Segundo o Monitor de Queimadas, as Terras Indígenas mais atingidas diretamente pelos focos de queimadas neste ano foram: TI Paresi, TI Manoki, TI Menku, TI Maraiwatsede., TI Nambikwara e TI Batelão. Já as TIs impactadas em seu entorno foram: TI Parque do Xingu, TI Manoki, TI Enawenê Nawê, TI Utiariti, TI Vale do Guaporé e TI Irantxe.

“E mais uma vez, vamos ser atingidos. O fogo passa para as aldeias, o Governo [do Estado] não tem estrutura, joga para o Governo Federal, que joga de volta para o Estado e nós no meio do fogo. Não conseguimos compreender porque as lideranças não encontram uma solução possível para evitar. Por que não antecipa, se já sabemos que o problema vai acontecer? Agora é a hora de antecipar, reunir quem é competente. Estamos alertando, pois temos conhecimento tradicional. Muitos de nós não têm estudo, mas têm experiência”, conclui.



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