Não faltam documentários do gênero True Crime hoje em dia, especialmente pelo aumento na popularidade e curiosidade do público em saber os detalhes sobre casos criminosos que ocorreram ao redor do mundo. O queridinho da vez é “O que Jennifer fez?”, um documentário que chegou na Netflix recentemente e já se tornou um dos mais assistidos da plataforma desde mês.
Só que o que muitos telespectadores notaram, sejam os familiarizados previamente com o caso ou os que pesquisaram sobre o assunto após assistir a série, é que o documentário deixou muita informação importante de fora. Inclusive, há muitos vídeos no YouTube que fizeram um trabalho bem mais detalhado em contar a história de Jennifer Pan, mesmo sendo um conteúdo totalmente gratuito na plataforma.
O assunto é interessante, mas o documentário da Netflix deixou muito de foraFonte: Netflix/Reprodução
Para que você não fique com dúvidas ou desinformado sobre um caso tão conhecido, nós te contamos a verdadeira sobre o caso envolvendo o crime de Jennifer Pan com os detalhes que não podem faltar. Confira logo abaixo!
Como era a vida de Jennifer Pan?
Jennifer Pan, nascida em 1986, cresceu com seu irmão mais novo Felix sob alta pressão de seus pais, Bich Ha Pan e Huei Hann Pan, dois refugiados do Vietnã que tentaram buscar uma vida melhor no Canadá antes dos filhos nascerem. Acreditando que isso ajudaria na vida adulta dos filhos, o casal tinha expectativas extremas do que eles deveriam fazer na vida acadêmica e em atividades extracurriculares.
Jennifer passou a ter aulas de piano e patinação artística aos 4 anos de idade, atividades que ela praticava quase todos os dias da semana que lhe renderam alguns prêmios regionais. Anos depois, ela também passou a tocar flauta na banda da escola. A grande esperança é que ela se tornasse uma atleta olímpica na patinação, mas o rompimento de um ligamento no joelho acabou com esse sonho bem cedo.
Segundo alguns amigos de Jennifer na época do ensino médio, os pais da garota monitoravam todas as suas atividades extracurriculares, não permitiam namoros ou que ela participasse de eventos informais da escola (como bailes, por exemplo). Eles também a proibiam que ela fosse em festas ou viajasse com amigos na época que acreditavam que a filha estava na universidade, o que resultou em Jennifer não ter uma vida social normal mesmo após chegar na vida adulta.
A rede de mentiras de Jennifer
A intensa pressão por entregar perfeição aos pais não rendeu resultados reais na vida acadêmica de Jennifer, já que ela sempre teve notas medianas ou até abaixo da média, especialmente no ensino médio. Para não ter que lidar com a retaliação do pai e da mãe, ela percebeu que poderia simplesmente mentir para eles.
Jennifer passou a forjar os relatórios com suas notas, levando os pais a acreditarem que ela estava sendo tirando notas máximas ou bem perto disso. Segundo alguns colegas de escola, ela também parecia fingir muito bem seu senso de auto-confiança e mascarava sua decepção quando não conseguia entregar uma boa performance musical ou na patinação, especialmente para não deixar os pais ainda mais decepcionados.
Seus planos de entrar na Universidade Metropolitana de Toronto também foram por água abaixo quando a instituição rescindiu sua admissão ao descobrir que Jennifer havia sido reprovada na matéria de cálculo no último ano do ensino médio. Foi nesse momento que a maior rede de mentiras da moça começou, já que ela passou a contar aos colegas e aos pais que havia sido aceita na universidade e que logo frequentaria as aulas.
A verdade é que ela nem chegou a se formar no ensino médio por causa de sua reprovação, algo que os pais não descobriram porque ela disse que não havia conseguido convite para que os dois fossem à sua suposta formatura. Nos anos seguintes, ela fingiu que ia nas aulas da faculdade, quando na verdade passava o tempo em cafeterias ou trabalhava como professora de piano e em restaurantes para ganhar um dinheiro próprio.
Para justificar a falta de gastos com a sua educação universitária, algo geralmente bem caro nos países da América do Norte, Jennifer falava que tinha recebido bolsas de estudo e que tinha recebido a proposta de cursar o programa farmacêutico da faculdade, chegando até a comprar livros usados no curso real e a assistir vídeos relacionados às aulas para criar cadernos cheios de anotações para mostrar aos pais.
Com tantas provas falsificadas da sua vida universitária, Jennifer conseguiu a permissão dos pais para ficar na casa de uma amiga nos dias de semana, alegando que era mais perto do campus onde estudava. A verdade é que ela simplesmente se hospedava na casa do namorado que tinha conhecido no ensino médio, Daniel Chi-Kwong. Nessa época, Daniel trabalhava em uma pizzaria e traficava drogas de forma bem ativa.
O fato que acabou com a vida falsa de Jennifer aconteceu quando ela disse aos pais que tinha arrumado um emprego voluntário em um hospital voltado para crianças. Quando notaram que a filha não tinha um uniforme ou uma identificação pessoal do hospital, Bich e Hann começaram a suspeitar das histórias da filha. Para saber o que estava acontecendo, sua mãe a seguiu no caminho do tal trabalho voluntário e descobriu toda a farsa.
A vida após as mentiras
Depois que foi descoberta, Jennifer quase foi expulsa de casa por seu pai, mas Bich insistiu que ele a deixasse ficar. Durante esse período, ela passou a estudar para terminar o ensino médio de verdade e seus pais a encorajaram a tentar a faculdade logo após. Ainda assim, eles a proibiram de ver ou conversar com o namorado ou ir a qualquer lugar que não fosse seu emprego como professora de piano. É claro que isso não adiantou muito e ela continuou a se comunicar com Daniel em segredo.
Jennifer criou uma verdadeira rede de mentiras em sua vidaFonte: Netflix/Reprodução
Eventualmente, Daniel cansou de manter um relacionamento tão restritivo e terminou com Jennifer, passando a namorar com outra mulher pouco depois. Ao descobrir do novo relacionamento, Jennifer recorreu às suas mentiras novamente e relatou ao ex que sua casa tinha sido invadida e que ela havia sido abusada sexualmente por todos eles, um evento que só poderia ter sido planejado pela nova namorada de Daniel.
De qual jeito ou de outro, as tentativas de Jennifer deram resultado e não demorou para que ela e Daniel voltasse a manter contato frequente, planejando até em morar juntos futuramente. Na cabeça deles, para que isso pudesse acontecer, os pais de Jennifer não poderiam atrapalhar e só viram uma maneira de lidar com a situação.
O crime de Jennifer
Em 2010, Jennifer entrou em contato com um antigo amigo da escola, Andrew Montemayor, que, segundo a garota, vivia se gabando de roubar outras pessoas no ensino médio. Ele nega que fazia isso, mas o fato é que Andrew foi o responsável por apresentar Jennifer à Ricardo Duncan, a primeira pessoa a qual ela pediu que matasse eu pai, mas Duncan recusou a proposta.
Seguindo esse evento, Jennifer e Daniel começaram a planejar a contratação de um assassino profissional, ao qual pagariam 10 mil dólares pela morte do pai e da mãe. O dinheiro viria direto da herança que a moça receberia em seguida, o que estava estimado em 500 mil dólares. Através de um dos conhecidos de Daniel, eles conseguiram entrar em contato com diversos homens que poderiam fazer o serviço, incluindo um chamado David Mylvaganam, que foi considerado como um dos assassinos pela promotoria posteriormente.
O crime em si ocorreu na casa da família Pan em Ontário no dia 8 de novembro de 2010, quando Jennifer destrancou a porta da frente de noite. Pouco depois, Mylvaganam e outras duas pessoas entraram na casa, apontaram armas à família, exigiram dinheiro, vasculharam alguns cômodos e levaram Hann e Bich ao porão, onde realizaram diversos disparos ao casal. Em seguida, eles pegaram 2 mil dólares de Jennifer, a amarraram à pedido dela e foram embora.
Quando eles já tinham saído da casa, a garota ligou para a emergência, relatando o que teria ocorrido sob a perspectiva de ser uma das vítimas do ocorrido. Quando as autoridades chegaram no local, constataram que Bich havia morrido, mas que Hann ainda estava vivo apesar de tantos ferimentos. Ele foi levado ao hospital rapidamente e depois foi transferido para uma unidade melhor equipada em Toronto. Felizmente, o irmão de Jennifer não estava presente no local durante o ataque.
Como ela foi descoberta?
Como planejado, inicialmente a polícia realmente acreditou que o ataque tinha sido apenas motivado por criminosos interessados nos bens da família Pan, só que não demorou tanto para que eles passassem a ter suspeitas sobre o caso. Além de que inúmeros itens valiosos não tinham sido roubados, os investigadores também acharam estranho que Jennifer foi apenas amarrada em seu quarto e que não sofreu qualquer ferimento, enquanto seus pais tiveram o tratamento totalmente oposto. O fato dela ter conseguido pegar seu celular e ligar para a emergência mesmo com as mãos amarradas também chamou bastante atenção.
Levou alguns interrogátorios para Jennifer confessar seu crimeFonte: Netflix/Reprodução
No dia seguinte, ela passou pelo seu primeiro interrogatório com a polícia, mantendo sua versão dos fatos. Mais tarde, Hann acordou de seu coma e contou à polícia que lembrava de ver a filha falando algo para um dos criminoso de maneira suave e amigável. Jennifer foi presa no dia 22 de novembro de 2010 e durante seu terceiro interrogatório, admitiu ter contratado assassinos profissionais, mas apenas para matar ela mesma e não os pais.
Vale dizer que no Canadá, os investigadores podem mentir durante interrogatórios se acreditam que isso ajudará a obter respostas ao caso. O oficial William Goetz utilizou desta tática com Jennifer, dizendo que eles tinham softwares capazes de analisar mentiras em testemunhos, além de alegar que existiam satélites capazes de analisar movimentos dentro de casas e prédios. Com isso, ele foi capaz de obter a confissão da moça sobre o que realmente tinha acontecido.
Qual foi a sentença de Jennifer?
O julgamento de Jennifer e seus cúmplices ocorreu apenas em 2014 e durou por muitos meses. Todos se pronunciaram como não-culpados para os crimes de assassinato em primeiro grau, tentativa de assassinado e conspiração de assassinato. A polícia incluiu movimentos captados pelos celulares usados pelos envolvidos, o tráfego de mensagens de texto e o conteúdo presente em mais de 100 mensagens enviadas entre Jennifer e Daniel nas 6 horas anteriores ao crime.
Ainda havia muitas evidências relacionadas à forma que os criminosos conseguiram entrar na casa tão facilmente, o roubo falso, os tiros e diversas inconsistências no testemunho de Jennifer, a sua falta de emoção, sua obsessão com o namorado, a confissão sobre o ataque e toda a pressão que viveu na vida por causa dos pais. No fim, Jennifer, Daniel, Mylvaganam e um homem chamado Lenford Roy Crawford foram considerados culpados e receberam prisão perpétua, com a possibilidade de liberdade condicional apenas após 25 anos.
Havia muitas inconsistências na versão do crime que Jennifer relatou inicialmenteFonte: Netflix/Reprodução
Menos de 10 anos após a sentença, Jennifer Pan continua presa, assim como os seus outros cúmplices condenados. O esperado é que a situação obviamente continue assim até que eles tentem pedir pela liberdade condicional, algo que não é garantido e pode ser negado diversas vezes ao longo dos anos.
O que aconteceu o pai de Jennifer?
Mesmo após um ataque tão brutal, Huei Hann Pan conseguiu se recuperar de seus ferimentos e continua vivo até hoje. Desde o ocorrido, tanto ele como Felix, o irmão de Jennifer, requisitaram e conseguiram uma ordem de restrição contra a moça, garantindo que ela não possa entrar em contato ou se aproximar de nenhum dos membros da família novamente. Além disso, Jennifer também foi banida e não pode entrar em contato com Daniel nunca mais.
Atualmente, tanto Hann como Felix vivem vidas mais reclusas e não dão declarações sobre o caso, claramente querendo voltar a ter uma vida mais próxima do normal dentro do possível. Esperemos que eles consigam, apesar de interesse renovado que o documentário da Netflix causou em tantas pessoas.